O governador Fernando Pimentel enviou à Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), nesta semana, um anteprojeto de lei que institui a Política Estadual dos atingidos por barragens e outros empreendimentos (Peabe). O documento vai garantir a interlocução entre os órgãos de governo competentes, os empreendedores e as populações atingidas. Esse anteprojeto tem a proposta, ainda, de solucionar uma demanda histórica, ao estabelecer diretrizes e mecanismos para balizar a ação dos empreendedores e do Estado nas tratativas de reparação e direitos das pessoas e populações que, por conta da instalação de barragens ou outros empreendimentos, têm sua vida completamente modificada.
A proposta da Política Estadual, a ser votada na Assembleia, além de reforçar os direitos de reparação (como indenização, reassentamento) das pessoas atingidas, também é inovadora por dispor de mecanismos claros para garantir a participação social em todas as etapas do empreendimento. Para tanto, prevê a criação de um Comitê Gestor, que será uma instância colegiada e paritária com a sociedade civil, responsável por homologar, para cada empreendimento, o Plano de Desenvolvimento Social e Econômico aos atingidos. Plano este que, vale ressaltar, será custeado integralmente pelo empreendedor.
Histórico:
O anteprojeto foi elaborado por um Grupo de Trabalho instituído em 4 de setembro de 2015 pelo governador e coordenado pela Sedpac com vistas à apresentação de uma proposta de política dos atingidos. Desde então a proposta vem sendo debatida, com a participação da sociedade civil, por meio do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) e de órgãos do Estado.
Com o rompimento da barragem de Fundão, em Mariana, reconheceu-se a necessidade de que a política alcance indivíduos e comunidades atingidas nos casos de desastres tecnológicos e garanta, também, a participação do poder público nos processos de negociação com as comunidades.
O Relatório da Comissão Especial “Atingidos por Barragens”, do Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa Humana, aponta para uma percepção de um padrão vigente de obras para implantação de barragens e operação de empreendimentos que tem propiciado, de maneira recorrente, violações de direitos humanos que acentuam as desigualdades sociais. Esta percepção, em conjunto com as demandas dos movimentos sociais dos atingidos, desde os anos de 1970, aponta para a necessidade de criação de uma política que permita, à sociedade e às populações atingidas dialogar com o Governo do Estado e com os empreendedores. Dessa forma, estariam contempladas as premissas da legislação ambiental e a garantia dos direitos materiais e imateriais, para que se avance na consolidação de um Estado socialmente justo e economicamente vigoroso.
Entre os objetivos da Peabe estão a garantia de participação social nas etapas de concepção, elaboração e realização dos estudos de viabilidade de barragens e outros empreendimentos no Estado, bem como o fortalecimento da atuação conjunta e articulada das esferas de governo na proteção aos direitos dos atingidos pela construção, instalação, ampliação e operação dessas represas de contenção de rejeitos.
Funcionamento:
A Peabe será coordenada e monitorada por um Comitê Gestor, com composição paritária entre poder público e a sociedade civil, integrado por 22 membros com direito a voto, bem como pelos respectivos suplentes. Os membros da sociedade civil serão escolhidos por meio de seleção pública coordenada pela Secretaria de Estado de Direitos Humanos, Participação Social e Cidadania (Sedpac) e pelo MAB.
Na exposição de motivos que justificam o projeto, o secretário de Estado de Direitos Humanos, Participação Social e Cidadania, Nilmário Miranda, afirmou que as normas propostas são complementares à legislação ambiental. “Para os empreendedores, a normatização traduz-se como uma linha-guia em termos das tratativas com pessoas e comunidades impactadas pelo empreendimento. Também auxilia na antecipação da resolução de conflitos que, hoje, ocorrem por meio de longos processos judiciais de reparação ou em negociações caso a caso e se mostram extremamente conflituosos entre os interesses das empresas e as demandas sociais”, apontou.
O projeto, segundo o subsecretário de Promoção e Defesa dos Direitos Humanos da Sedpac, Leonardo Nader, “é fruto de discussões intensas com os movimentos sociais, pavimentando um futuro onde cada empreendimento ocorra no contexto de respeito aos direitos das pessoas afetadas por sua construção ou operação”. Além disso, a proposta “é um exemplo de que questões econômicas, sociais e ambientais podem coexistir e até criar sinergias, provando que nossa sociedade pode prosperar quando ninguém é deixado para trás”, ressaltou.
Para Joceli Andrioli, membro da coordenação nacional MAB, o envio do projeto de lei à ALMG é um marco histórico e Minas sai na frente dos outros estados. “O Brasil precisa ter um marco regulatório que garanta os direitos da população atingida por barragens e outras obras em todo o país. Minas dá exemplo ao enviar esse projeto à Assembleia”, disse, acrescentando que haverá, agora, um intenso trabalho junto aos parlamentares pela aprovação do projeto.